sábado, 30 de novembro de 2013

Gentileza vs Cavalheirismo

Baseado na leitura do post Cavalheirismo é machismo, do blog Papo de Homem. Link para o texto na íntegra aqui: http://papodehomem.com.br/cavalheirismo/

Eu me considerava uma pessoa gentil até certo ponto; quando ajudava ou agradava pessoas, acredito que o fazia independentemente de qualquer fator. Confesso que ajudo muito mais as pessoas do meu convívio do que estranhos, mas às vezes dou um pacote de bolacha para menino de rua, junto do chão um pertence que alguém derrubou sem querer, doo roupas e brinquedos antigos, empurro o carro para fazer pegar, ajudo a carregar algo pesado, etc.

Entretanto, meu pai relatou a seguinte experiência quando ele passou uns dias em Londres: certo dia, no metrô, viu uma senhora carregando uma mala bem grande escadaria abaixo, a qual, julgou ele, estava tendo dificuldades. Ele se aproximou e ofereceu ajuda, mas no momento em que ia se curvar para pegar a alça da mala, a senhora fez cara feia e recusou veementemente a ajuda. Pelo que pude supor da situação, ela deve ter se sentido ofendida, pois oferecendo ajuda, era como se meu pai estivesse dizendo implicitamente que ela não era capaz de carregar a mala sozinha. Podia ser que ela realmente não estivesse com dificuldades, mas meu pai não é muito de ajudar estranhos, então provavelmente não se ofereceria se não tivesse identificado claramente a dificuldade da senhora. Minha mãe estava junto, então ela pode ter intimado meu pai a ir ajudar a senhora, mas não quero ficar divagando sobre qual era a situação exata, até porque eu não estava lá e nunca vou poder saber o que aconteceu de fato.

O ponto é: acredito que meu pai tenha sido mal interpretado pela senhora. Era uma questão de ser gentil, mas ela pensou ou que ele a estava chamando de “velha fraca decadente”, ou que ele estava sendo cavalheiro, e portanto machista, se entendi bem o texto.

Desde que soube dessa história, em certas ocasiões passei a tomar uma posição de não ajudar nem ser gentil com as pessoas para não ser mal interpretado da mesma forma que meu pai foi. Ou então o fazia de forma tão discreta que não daria a entender que era eu quem estava ajudando: quando não havia nenhum assento disponível no ônibus e notava que havia entrado uma pessoa de idade, um deficiente ou uma gestante, eu me levantava e me afastava do lugar onde eu estava sentado um pouco antes de aquela pessoa se aproximar, de forma que ela visse com antecedência o lugar livre e o ocupasse. Às vezes dava errado, pois outra pessoa qualquer se apressava mais e tomava o lugar que eu havia liberado. Talvez fosse um pouco de covardia da minha parte em não querer ser julgado pela minha ação, seja positiva ou negativamente, e portanto eu deixava a gentileza à mercê do acaso, me excluindo de qualquer possível responsabilidade. “Se outro espertinho se apressou e sentou no lugar daquela velha, não é culpa minha.”

Especialmente quando se tratava de fazer uma boa ação a mulheres em geral, essa paranoia se acentuava mais ainda: não ajudava com malas, não abria a porta do carro nem segurava a porta num local público, não cultivava o “primeiro as damas”, não oferecia qualquer tipo de auxílio ao perceber um problema. O que é mais louco é que eu segurava sim a porta para homens, por exemplo, e também sempre carregava as malas da família junto com o chofer ou com o funcionário do hotel em viagens. Devia ser meu subconsciente dizendo que nestes casos estava tudo bem, pois não havia nenhuma forma de ser considerado como machismo. Certa vez quando estudava Matemática Aplicada (uma disciplina de 4º semestre das Engenharias na UFRGS), me recusei a explicar a matéria mesmo depois de a guria ter mencionado ter dificuldades em compreender. “Ah, vai estudar, pô. Isso aí é preguiça de ler a apostila, isso sim. Não tem como não ter entendido se tu tiver lido direito.”

Hoje em dia vejo que essa minha reação naquela vez foi definitivamente extremada e insensata. Mas de algum modo, também é uma paródia ao comportamento de algumas “feministas” extremistas (entre aspas porque não exercem de fato a ideologia feminista da forma como ela é caracterizada, e apenas enxergam machismo em tudo, parece até aquelas teorias conspiratórias malucas dos Illuminati ou dos reptilianos), que certamente existem por aí também.

Acho que minha visão é mais relaxada e desprendida atualmente. Eu achava que entendia o feminismo, e para mostrar para mim mesmo que me preocupava, não fazia gentilezas para não ofender ou menosprezar as pessoas, em especial as mulheres. Hoje penso que isso era apenas uma espécie de cavalheirismo às avessas bizarro, que só contribuía para um mundo mais frio e individualista. Atualmente eu seguro a porta e ajudo a carregar as malas sim. Se a pessoa gostar, gostou; se não gostar, dane-se. Só que não pago a conta sozinho, nem ofereço meu lugar no ônibus (continuo usando aquele esquema de levantar antes).

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